Se for pelas crianças, pode ser. Pelos homossexuais, valha-nos deus, nem pensar
Eu sou intolerante com a intolerância: é tempo de apontar os dedos a quem atenta contra o direito constitucional (e humano) da igualdade.
A filósofa Hannah Arendt explica que, quando as elites pensantes (e nestas incluo os nossos deputados - mas não todos) têm atitudes autoritárias ou discriminatórias, logo os fascistazinhos de esquina se sentem legitimados a sair da toca. Envergam a espada ideológica de uma suposta cruzada em nome da sociedade que, dizem, desmoronará caso o superior interesse da criança seja maculado pela proximidade de alguém com uma orientação não-heterossexual. Agem segundo o que acreditam ser o seu dever, cumprindo ordens superiores (divinas, em algumas das suas alucinações pseudo-religiosas), movidos pelo desejo de ascender na carreira profissional-política, como o jota Hugo Soares ou, simplesmente, por desejarem notoriedade na comunicação social ou no seu bairro. A isto chama-lhe banalização do mal.
Educação moralista, machista e católica
Acredito que algumas pessoas o façam pela educação moralista, machista e católica que tiveram. Mas também é essa educação o motivo que leva alguns homens a espancar as esposas e namoradas porque se atreveram a colocar um pé fora de casa ou porque trocaram um olhar com outra pessoa. Devemos desculpabiliza-los? Nunca! Eu sou intolerante com a intolerância: é tempo de apontar os dedos a quem atenta contra o direito constitucional (e humano) da igualdade. Porque a teoria de que se é mais democrático por aceitar atos e ditos anti-democráticos ou fascistas é isso mesmo: fascista.
Por isso, quando vejo argumentações como a de que a possibilidade de coadoção em famílias homoafetivas não serve exclusivamente para defender as crianças mas que tem o “pecado” de reconhecer direitos a homossexuais, como se tal fosse uma coisa negativa, não posso deixar de me indignar. Sim, serviria para proteger as crianças e, sim, serviria para colocar os homossexuais portugueses ao lado de todos os outros na Europa Ocidental e noutros países democráticos do Mundo. Em pé de igualdade com as outras pessoas, independentemente da sua orientação sexual.
Pugnar pelos Direitos Humanos, de adultos ou de crianças, não deveria ser um problema. Deveria ser um orgulho e um ato diário, com as nossas famílias, nas escolas ou locais de trabalho.
Desta vez não passou a legislação que permitia o reconhecimento da dignidade de famílias que já existem de facto, por muito poucos votos no Parlamento. E assim permanecemos ao lado de países como a Rússia, o Uganda e a China ao não permitir que, por exemplo, os filhos herdem bens, ou que pais e mães de toda uma vida não possam assumir as responsabilidades parentais em caso de morte do outro cônjuge. O que continuará a acontecer é, portanto, a possibilidade de crianças que já têm uma família poderem, de um momento para o outro, perde-la e serem entregues a familiares longínquos ou até a instituições sociais. E, nos adultos, a manutenção de uma discriminação legal que insulta, descredibiliza e acusa pessoas de não terem dignidade para serem responsáveis por cuidar de crianças – de que sempre cuidaram - apenas porque têm uma orientação não-heterossexual. Prejudicar seres humanos, sejam crianças ou adultos, com base numa suposta superioridade moral imaculada dos heterossexuais é, para mim, extremamente desumano.
Sou mais exigente do que o Estado português no que toca a confiar a guarda de crianças a outras pessoas: interessa-me muito menos o que fazem no quarto do que se são gente decente
O meu tio Alfredo era, para sermos rigorosos, um energúmeno. Embebedava-se, batia na minha tia e maltratava os filhos. Só não comentava notícias nas caixas de comentários dos jornais online porque, felizmente, era analfabeto. Mas de resto, em termos de primarismo e de estupidez, era muito completo. No entanto, praticava o tipo de sexualidade que Deus recomenda na Bíblia, pelo que, aos olhos da lei, tinha todas as condições para educar uma criança. Não educaria as minhas, porque eu sou mais exigente do que o Estado português no que toca a confiar a guarda de crianças a outras pessoas: interessa-me muito menos o que fazem no quarto do que se são gente decente. Sou esquisito, bem sei, mas não consigo evitá-lo.
Há uns cinco ou seis anos, uma jornalista do Jornal de Notícias perguntou-me se eu preferia que as minhas filhas fossem lésbicas ou sportinguistas. Confesso que já não recordo o contexto histórico em que a questão foi colocada, mas tenho a certeza de que ia ao encontro das inquietações que perturbavam mais profundamente o público leitor daquela altura. Lembro-me, isso sim, de achar que a pergunta era, digamos, parva: pressupunha que aquelas alternativas constituíam os dois destinos mais horrorosos que os nossos filhos podem ter quando, na verdade, são apenas uma característica pessoal normalíssima (no caso do lesbianismo) e uma opção irreflectida (no caso do sportinguismo). Portanto, respondi que preferia que as miúdas fossem lésbicas, uma vez que a homossexualidade não é defeito. Como pai, preocupo-me sobretudo com a felicidade das minhas filhas, e sei que a orientação sexual não impede ninguém de ter uma vida feliz. Já quanto ao sportinguismo, não tenho a certeza.
Esta semana, segundo me disseram, outro jornal resolveu recuperar essas minhas declarações, mas omitindo o facto de terem sido proferidas em resposta a uma pergunta. Ao que parece, o jornal titulava apenas: "Preferia que as minhas filhas fossem lésbicas do que sportinguistas". Ora, posta assim, a frase é extremamente ofensiva. Para as lésbicas. Parece que eu, por minha iniciativa, escolhi o lesbianismo como um mal menor. Na verdade, não considero que a homossexualidade seja sequer um mal, quanto mais um mal menor. Mesmo quanto ao sportinguismo, devo dizer que tenho muitos amigos sportinguistas, e estou firmemente convencido de que eles devem poder casar entre si e até adoptar crianças. Fica o esclarecimento.
Dito isto, talvez surpreenda o leitor que eu seja a favor do referendo à coadopção por casais do mesmo sexo. De facto, creio que devia haver um referendo à coadopção por casais de todos os tipos. Se, apesar do que diz a ciência, as preferências sexuais dos pais interferem na educação de uma criança, creio que uma sociedade responsável deve esforçar-se por saber mais sobre o assunto. Os cidadãos não devem ficar só pela rama, e descobrir apenas se os pais apreciam manter relações sexuais com elementos do mesmo sexo, ou de sexos diferentes. Precisamos de saber exactamente de que tipo de sexo estamos a falar, com que frequência ocorre, em que locais, quanto tempo dura, e que género de expressões os membros do casal gritam um ao outro. A minha vizinha de cima diz ao marido certas coisas que nenhuma criança devia ouvir.
Percebo o horror com que alguns terão visto em maio a aprovação do projeto de lei sobre coadoção em casais do mesmo sexo. Terá sido um choque darem-se conta da existência, entre nós, de casais do mesmo sexo com crianças. É compreensível: são crianças iguais a todas as outras, não andam por aí com uma cruz na testa ou na lapela. Não há notícias de tumultos nas escolas que frequentam, nos prédios e nas ruas onde vivem com a família. Aliás, até há muito pouco tempo, não havia notícias: podia acreditar--se que estas crianças não existem.
Quem se habituou a pensar assim, quem gosta de pensar assim, prefere agarrar-se a essa ideia. É por esse motivo que de cada vez que se fala de coadoção em casais do mesmo sexo - a possibilidade de um dos cônjuges solicitar a um tribunal que lhe permita adotar o filho, biológico ou adotivo, do outro cônjuge, filho esse que vive com os dois, que é criado pelos dois e chama mãe ou pai aos dois (e que não pode ter mais nenhuma mãe ou pai reconhecido pela lei, porque se tiver a coadoção é interdita) - há quem fale de adoção por casais do mesmo sexo. Conduzir o debate para a possibilidade de adotar, em conjunto, uma criança disponível para tal e até aí sem laços com o casal permite dizer coisas como "as crianças devem ter direito a um pai e a uma mãe"; "a adoção não é um direito dos adultos, é um direito das crianças"; "não sabemos o efeito numa criança de ser criada por dois pais e duas mães, por isso é melhor não arriscar" - etc. Sobretudo, permite fingir que se está a pôr acima de tudo a preocupação com as crianças, quando a intenção é a contrária.
Negar a determinadas crianças o direito de gozar da proteção que lhes confere o reconhecimento legal de dois progenitores em vez de um: é isso que quer quem recusa a coadoção em casais de pessoas do mesmo sexo. Tem um tal horror aos homossexuais que não hesita em sacrificar o bem-estar muito concreto das crianças muito concretas que com eles vivem. Como bem sabe que isso é vergonhoso, finge estar a tentar impedir que "se entreguem crianças a homossexuais" e pede um referendo "para a sociedade decidir".
Entendamo-nos: as crianças em causa na lei da coadoção nunca vão ter "um pai e uma mãe". Têm duas mães ou dois pais e tê-los-ão sempre - quer a lei lhos reconheça ou não. Não está em causa decidir com quem essas crianças vivem, quem vai educá-las e amá-las e quem elas vão amar. Essa decisão não nos pertence. A nossa opção é entre aceitar e proteger essas famílias ou rejeitá--las e persegui-las. Entre dizer a essas crianças "a tua família é tão boa como as outras" ou "a tua família não presta". Referende-se então isso: "Tem tanto horror aos homossexuais que deseja que a sociedade portuguesa decida em referendo discriminar os filhos deles ou acha que a lei portuguesa deve deixar, o mais depressa possível, de fingir que essas crianças não existem e o Parlamento lhes deve garantir os direitos que lhes faltam?"
1- todos os cidadãos tem a mesma dignidade social e são iguais perante a lei
2- Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual
Após ver as notícias de hoje, sinto-me completamente triste e indignado pelo que acabo de assistir: ainda se coloca em questão a possibilidade de se legalizar, em plena Assembleia da República, a adopção por parte de casais do mesmo sexo.
Em Portugal, e cada vez mais nos tornamos rapidamente numa excepção, uma família só é considerada legal e normal se tiver um Pai e uma Mãe. Existem mentalidades que ainda não conseguem aceitar a ideia de Família e Amor como algo Universal, independente de quantos Pais ou quantas Mães tiver.
Pelos vistos na nossa Assembleia todos têm famílias ditas “normais” e são todos amados e amam pessoas do sexo oposto. Ainda vou mais longe… Pelos vistos quem manda nas nossas leis, quem faz com que o nosso País progrida e se desenvolva, não tem o Amor como algo que acontece entre Seres de uma mesma espécie, independente de sexo, cor, escolhas, orientações.
Que País é este em que eu vivo e trago os meus filhos para viver? País que ainda o escrevo e descrevo com letra grande, pois ainda acredito estar embrulhado num pesadelo e amanhã será tudo mentira. Que País é este no qual os MEUS filhos não podem ter o meu nome?
Que País é este no qual eu não posso ser um PAI? Eu e o Luís temos 2 filhos e vamos a “caminho” do terceiro. É importante contar-vos as suas histórias.
O Bernardo tem 4 anos, prestes a fazer 5 aninhos no próximo dia 13 de Maio. Veio para nós com 11 meses. Tem Trissomia 21. Veio de uma família carenciada, a qual não tinha a disponibilidade de oferecer afecto e muito menos proporcionar a vida saudável que o menino precisa e que neste momento tem (escola, tratamentos específicos, actividades). O desenvolvimento do Bernardo tem sido fantástico desde que se juntou a nós.
A Lurdes tem 3 anos, acabados de fazer no dia 8 de Janeiro, no mesmo dia em que comemoro o meu aniversário. Veio da Guiné. Era uma criança que tinha UMA refeição por dia, refeição a qual não era nem de perto nem de longe suficiente para sequer alimentá-la naquela meia hora que se passava. Hoje em dia é a criança com maior nível de desenvolvimento da sua Escola.
Agora, vem aí o Eduardo que nasceu no passado dia 4 de Novembro. Vai fazer 3 meses. Eduardo nasceu na Instituição na qual fui buscar a Lu. Ligaram-me no dia em que ele nasceu dizendo que tinha nascido uma rapazinho lindo e como forma de me mostrarem o quanto estavam agradecidos pela vida e saúde da Lurdes, iriam baptizá-lo como o meu nome. Fiquei emocionado. Passou-se uma semana ligaram-me novamente: o pequeno Eduardo tinha sido internado com graves problemas de saúde e não sabiam como seria a sua vida dali para a frente. Depois do choque, recompus-me e pedi que me deixassem apadrinhá-lo. Consegui, graças a Deus, cuidar deste bebé de longe e poder de alguma forma contribuir para a sua VIDA. Passaram se 3 semanas e o pequeno Eduardo voltou para a Aldeia (Instituição).
O Líder ligou-me novamente e disse-me que o menino estava estável e que esperava agora que ele tivesse a mesma sorte que a Lu, já que iria ficar ali com eles até aparecer alguém que o quisesse, adoptasse, o enchesse de amor. Não hesitei e no mesmo segundo respondi: “ O Eduardo já tem a mesma sorte que a Lu e o Bernardo, porque nós queremos adoptar o Eduardo!”. E assim estamos: à espera de o poder trazer.
Três histórias de três crianças que não tinham família, amor, uma casa, refeições diárias, escola, roupa, saúde… E por aqui poderia ficar horas a escrever. Agora multipliquem estas 3 crianças por milhares que estão, infelizmente, espalhadas pelo Mundo em lugares que nós nem sabemos que existem. Agora, imaginem quantas famílias as podem ou querem adoptar. O número não é igual, pelo contrário, é menor a quantidade de famílias em espera para adopção do que as crianças que estão à espera para serem adoptadas. Desse número vamos eliminar os casais homossexuais e os pais solteiros/mães solteiras. Ficamos como? Meu Deus… O que será de tantas crianças?
Gostaria e juro por Deus que faço questão que me expliquem o que a minha família tem a menos do que uma família onde os pais são heterossexuais? Como se diferencia o Amor? Sim, porque não estamos a falar das possibilidades materiais, estamos a discutir AMOR. Enfim… O meu sonho: que os meus 3 filhos sejam felizes e com muita saúde sempre… e que um dia, no meu País que eu tanto amo, possam assinar BORGES FERREIRA.
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